domingo, 5 de junho de 2016

O Retorno de Inanna - XV e XVI

V. S. Ferguson

O Retorno de Inanna 

Capítulos XV e XVI



XV.- GANDIVA

Os filhos de Enki cresceram conscientes de que toda a Terra lhes teria pertencido se não tivesse sido por Enlil e seus filhos. O rancor e aversão que Enki sentia por seu irmão Enlil se infiltrou nas vidas de seus filhos como um veneno. Os enkitas estavam apaixonadamente decididos a vingar-se e se opunham a cada passo que dava Enlil. Como Enki perdeu o controle sobre seus filhos, o ódio deles afundou a família. Marduk e seu filho Nabu trataram de arrebatar o poder a seus próprios irmãos. Nergal não estava disposto a entregar todo seu poder a Marduk e opôs a maior resistência chegando até a formar uma aliança com Ninurta, filho de Enlil.

Ninurta comandava os esquadrões de vôo enlilitas que patrulhavam a Terra. Ele tinha conduzido as famosas Hordas Gutianas para a Acádia para destruir o que ficara de meus exércitos.
Também lhe encomendou a tarefa de recuperar os sistemas de águas do Eufrates depois que Marduk os tinha poluído.

Ninurta e sua esposa, Gula, estavam na cidade de Lagash. Ninurta, a quem adorava voar e comandar a força aérea, também era aficionado à construção e a engenharia. Esperava ansiosamente o desafio de limpar o rio. Mas detestava o assunto de governar e não tinha paciência para a vida social que suportam estes deveres. Sua esposa Gula estava muito dedicada a ele mas Ninurta era muito esquisito para ser companhia de alguém. Talvez ele tenha levantado uma parede a seu redor para desviar os constantes cuidados de Ninhursag, sua dominante mãe.

Ninurta ficou muito introvertido, descuidou do controle do governo e desaparecia durante dias. Escapava em sua nave favorita, o Pássaro Negro.

Ele queria construir pirâmides; dos tempos da guerra sentiu inveja das grandes pirâmides do Egito e convidou aos arquitetos que tinham tomado parte no desenho e construção de Gizé para que começassem a trabalhar na Suméria. Isto o manteve ocupado por um tempo perto de casa, por isso sua esposa se alegrou. Mas paulatinamente a tentação de voar sozinho em sua nave o venceu. Afastou-se de toda civilização e voava sem cessar através de montanhas longínquas. Ali formou uma legião de lutadores e lhes ensinou as artes marciais. Desfrutava muito da companhia destes homens rústicos.

Ninurta estava enfastiado do estilo de vida de sua família, os deuses. Preocupado por nossos conflitos eternos, ele recordava sua infância quando a Terra era ainda uma aventura desconhecida. Desejava essa época quando estava livre das ominosas responsabilidades de ser o filho de Enlil. Tenho que reconhecer que eu nunca cheguei a compreender completamente a Ninurta. Ele é uma pessoa muito complexa, atormentado pela carga de seus deveres e uma necessidade premente de simplesmente ser um garotinho brincalhão, o garotinho que talvez nunca tinha sido.

Como Ninurta estava fora por longos períodos, Marduk começou a olhar a Babilônia e suas cidades circundantes. Ele e seus seguidores começaram a infiltrar-se nos povos da campina e, empregando hologramas, aparecia-se ante os líderes de certas tribos identificando-se com diversos nomes. A estas tribos lhes incentivou a que se inclinassem e adorassem ao Deus Marduk. Ele executou muitos milagres para as pessoas, deu-lhes poder e riqueza e lhes advertiu que os deuses de Enlil e sua classe eram deuses falsos. Dizia-lhes que os que não o adorassem seriam castigados; condenados ao inferno para sempre.

Durante séculos os humanos tinham sido preparados para adorar algo que estava por fora deles, ou seja a nós. Contra esta manipulação eles tinham muito pouca defesa.

Como foram, ou seja, qual dos deuses era verdadeiro? Certamente todos os deuses eram volúveis; mais de uma vez tinham deixado os humanos abandonados à sua sorte. As pessoas das tribos raciocinava que possivelmente deveriam adorar ao deus que lhes proporcionasse o melhor, ou que talvez seria melhor lhe obedecer a aquele que ameaçava com castigos horríveis.

Marduk era um gênio para confundir as pessoas. Começou a ganhar na devoção dos Lulus ao corromper levemente o poder dos outros deuses. A ciência do controle mental e a propaganda para lavar o cérebro estavam em suas primeiras etapas.

Devido à ausência de Ninurta, Enlil teve que nomear alguém mais idôneo para a tarefa de governar a Suméria. Escolheu a meu pai Nannar. Da cidade de Ur, Nannar e minha mãe Ningal começaram a reconstruir as rotas comerciais normais e a restaurar a agricultura e os negócios na área. Os templos reataram suas atividades normais e se construíram novos zigurates.

Não obstante, as coisas não estavam bem de tudo. No ar da Terra se sentia a fricção e o antagonismo. Era como se o planeta fosse um ser que não pudesse suportar os ódios e disputas dos deuses. Uma sensação de ansiedade começou a rodear tudo. A ambição e a avareza corriam rápido por toda a Terra; logo que se inaugurava uma monarquia era destronada por outra. As escaramuças aumentavam enquanto os estados de ânimo se exacerbavam. Os olhos de Marduk liam por cima de seus futuros domínios.

Podem ler a história deste tempo, pois se escreveu muito nas tabuletas de argila. Marduk e seu filho Nabu lutaram sem cessar para ganhar o território e controle do porto espacial. Ao lado de Enlil estavam meu pai Nannar, meu irmão Utu, Ninurta e Nergal, filho de Enki.

Para acabar com essas horríveis guerras, Matali foi visitar seu velho amigo Enki. Matali sempre tinha estado ao comando da nave pessoal de Enki e os dois tinham passado muitas horas juntos. Matali rogou a Enki que falasse com seus filhos. O que se obteria com toda esta luta? Com certeza a Terra e sua gente só sofreriam mais. E se os filhos de Enki e Enlil morressem na batalha? O que sobraria a um dos dois patriarcas? O resultado desta guerra só poderia ser a aniquilação mútua, posto que ambos os lados tinham armas poderosas. Se Anu escolher o Gandiva, ninguém poderia evitar a aniquilação. Quem poderia predizer o fim de uma guerra tão devastadora?

Depois de escutar Matali, Enki visitou seu filho Nergal e tratou de raciocinar com ele. Mas Nergal se negou; ele sempre tinha acreditado que Enki preferia a Marduk. A verdade era mais comovedora: Marduk exercia uma forma sutil de controle mental sobre seu pai e Enki era simplesmente impotente em presença de Marduk. Nergal se zangou muito pelos esforços de Enki para que se obtivesse a paz com Marduk. Enfurecido, disse a Enki que partisse e amaldiçoou tanto a seu pai como a seu irmão, prometendo destruí-los.

Sozinho, o pobre Enki chorou tristemente. Não sabia o que fazer e recordava as épocas mais felizes, as festas de Antu.
Os profetas da fatalidade começaram a multiplicar-se por toda a Terra. Todo sacerdote e adivinho contava histórias da destruição que se avizinhava e oráculos em todos os templos profetizaram o fim do mundo. Muitas das predições foram absurdas e nunca se cumpriram, mas era como se a gente estivesse viciada nestes pronunciamentos. Quanto mais horrorosas eram as predições, mais gente pagava para as escutar.

Os profetas estavam na verdade fazendo seu agouro!

Levantaram-se novos edifícios para abrigar os Lulus que desejavam reunir-se para encher-se de temor. Entre as profecias mais populares estavam os contos de escassez de alimento e a devastação de cidades inteiras, enquanto que os terremotos e dilúvios lutavam pelo segundo lugar. Os Lulus gastavam todo seu dinheiro por vir e escutar estes contos, que os assustavam até a loucura. Este temor gerava uma energia da qual Marduk aprendeu a alimentar-se, e começou a fomentar o medo projetando imagens holográficas no céu e criando cenas aterradoras. Experimentou com a energia desse temor, manipulando-a e modificando-a para saciar seu apetite. Era melhor que a carne humana e mais fácil de administrar.

As profecias se tornaram realidade. Num dia terrível, os exércitos de Marduk caíram sobre Nippur, a cidade sagrada de Enlil. Ninurta chegou com suas tropas para defendê-la, mas o templo e os tronos sagrados já estavam destruídos. Enlil respondeu de uma maneira implacável ordenando a destruição da Babilônia, a cidade preferida de Marduk, assim como de todos os seus centros logísticos.

Enlil reuniu o conselho de guerra e fez a Anu a temida pergunta. A arma Gandiva só podia ativar-se sob a ordem de Anu porque, uma vez desencadeada, não se podia predizer o resultado. Nergal tratou de reunir-se pela última vez com seu irmão Marduk. Se este renunciava a suas pretensões de domínio supremo, o Gandiva permaneceria inativo. Enki, que estava presente com Marduk e Nabu, parecia estar em um estado de cegueira, como se sua vontade tivesse sido minada. Sumido na escuridão, Enki jogou sua ira e frustração sobre Nergal, pelo que a ira deste aumentou. Decidido a usar o Gandiva, Nergal deixou Marduk e seu pai. Agora já nada poderia detê-lo.

Todos os deuses estavam conscientes dos perigos possíveis do Gandiva. Inclusive Marduk sentiu medo quando se deu conta de que seu irmão Nergal estava disposto a usá-lo.

Anu se encheu de angústia. A inveja de seus filhos tinha levado a Terra a este estado. Deu-se conta de quão fraco se tornou seu filho Enki e preferiu destruir as cidades e o porto espacial do que permitir que tudo ficasse nas mãos do turbulento Marduk. Anu e Enlil viam algo escuro, quase perverso em Marduk e suas ambições. Ele queria se apoderar do planeta Terra, arrebatar o poder de Anu e inclusive governar as Pleyades. Converteu-se em uma ameaça séria, uma espécie de máquina que devorava tudo o que encontrava no seu caminho. Sem sentimento, sem coração, sem gozo de ser, só pensava em uma conquista desumana.

Anu desencadeou o Gandiva. "Uma labareda de luz, afiada como uma lâmina de barbear e mais forte que o sol, com um movimento em forma de zig-zag. Embora apontada para objetivos específicos, esta arma da perdição não fazia distinções."

Não só se destruiu o porto espacial; muitos outros lugares importantes para Marduk do ponto de vista logístico desapareceram. A península do Sinai foi destruída totalmente. Mas havia algo primitivo que não tínhamos planejado e que não podíamos controlar: o vento.

É irônico que o nome de Enlil pode significar "O Senhor do Vento", mas nesse momento nem Enlil nem nenhum outro deus pôde controlar os ventos que sopravam sobre a Suméria. Nuvens de radiação arrasavam as planícies matando todo ser humano e animal no seu caminho. O envenenamento por radiação desintegrava as células de seus corpos, a pele caía de seus ossos, seu sangue se evaporava nos ardentes ventos e morriam em meio de uma dor aguda. Os que estavam na periferia foram os que mais sofreram porque sua morte foi mais lenta. As terras ficaram negras com os fogos nucleares e as águas ficaram envenenadas.

A salvo em suas naves, os deuses observavam uma vez mais como seu frenesi destruía, de novo, milhões de vidas. Povos inteiros desapareciam; animais e colheitas, pontes e zigurates desapareciam da superfície do planeta, enquanto a Terra se agitava violentamente. O que tinham feito eles? Somente uns quantos sobreviventes permaneceram em meio da espantosa devastação do que uma vez foi um planeta verde e formoso. A violência do Gandiva e as nuvens de radiação criaram um impacto que se converteu em uma onda que enviou um sinal para o sistema solar.

Movendo-se além dos últimos planetas do sol, o sinal viajou por toda a galáxia até chegar a outros setores. Além da vastidão do espaço, o sinal foi recebida pelo Conselho da Federação Intergaláctica. Esses pleyadenses que se divertiam no planeta Terra tinham ido muito longe; terei que detê-los. Um comportamento tão irresponsável era inadmissível. Tinham alterado o equilíbrio de todo o universo. Fez-se um chamado e todos fomos citados ao Grande Salão do Conselho da Federação Intergaláctica.
Nós tínhamos estado tão entretidos em nosso jogo e em nossas brigas que esquecemos por completo do resto do universo. Quem eram estes intrusos que se atreviam a interromper nosso jogo? Anu sabia muito bem quem eram eles e convocou a todos com autoridade.



XVI.- INTERFERÊNCIA

O Grande Salão do Conselho Intergaláctico era uma sala de reunião imensa com tetos transparentes e arqueados que davam ao espaço infinito. Anu, Enlil, Enki, Ninhursag, Nannar, Ninurta, Nergal, Utu e eu estávamos todos formalmente sentados no círculo do Conselho. Marduk não quis assistir. De repente eu me senti pequena e me alegrei de que Anu estivesse ali, mas até ele parecia diminuído neste lugar. Só a presença dos membros do Conselho nos deixou humildes, um sentimento que não estávamos acostumados.

Os Doze Superintendentes do Conselho eram uma amostra representativa das galáxias. No auditório havia centenas de outros representantes de todo o universo. Tantas espécies! Havia membros de Sírio, Andrômeda, Orion, Arcturo e muitos outros sistemas.

Os Etéreos estavam muito bem representados. Eles têm uma freqüência vibratória muito alta. Às vezes se vêem sólidos, outras vezes transparentes ou translúcidos e se diz que estão por cima da polaridade, embora eu ainda não experimentei esse estado. Eu não sabia por que, mas parecia que os Etéreos tinham a última palavra na condução da reunião.

Também vi seres que eram esferas ou bolas de luz e voavam ao redor de nós, transformando-se nas cores do espectro; primeiro dourado, depois rosado ou turquesa. Possuíam a habilidade singular de entrar dentro de nós com permissão, de encher suas células com luz e, por meio disto, conhecer a soma total de seu ser. Pareceu-me que isto era uma maneira muito interessante de comunicar-se. Eu estava feliz com todas estas novas experiências quando a disposição de ânimo no Salão trocou.

Quando Anu ficou de pé diante Dos Doze, deles saiu simultaneamente um som o qual se converteu em palavras que foram claramente entendidas por cada raça: "NÃO INTERFERÊNCIA!"

Não interferência é a lei do universo do livre-arbítrio e nós, disseram Os Doze, tínhamos violado esta lei ao interferir diretamente na evolução de uma espécie. A lei afirmava que era possível ajudar à evolução dos seres se, e somente se, eles solicitavam essa ajuda. Alterar seu DNA e romper os campos eletromagnéticos de um planeta inteiro com a arma Gandiva era algo monstruoso e ilegal.
Eu pensava para mim que este conceito de livre-arbítrio devia ser como o mercado livre na Terra: é somente livre quando serve aos que estão no poder. Parecia-me que este Conselho estava tratando de nos pressionar ao interferir com nosso livre-arbítrio.

Para o Conselho era óbvio que não entendíamos muito bem, de modo que nos explicaram cuidadosamente que não iriam nos castigar, fazer a gente voar em pedaços ou a confiscar nossas armas. Contudo, algo nos aconteceria. Um estado de consciência, uma energia, uma disposição de ânimo que refletia a totalidade de nossas ações na Terra chegaria até nosso mundo. Esta energia lentamente mas com certeza afogaria a criatividade e espontaneidade de nossas vidas. Veríamo-nos bloqueados, incapazes de evoluir. O Conselho chamou a esta energia a Parede. Claramente explicaram que nós não fomos vítimas, que nós mesmos tínhamos criado esta Parede. Era nosso próprio invento. Nós não os criamos.

Também nos proibiram de usar o Gandiva outra vez. O fazê-lo, seria considerado como um ato de guerra e pagaríamos as conseqüências. Se nós não acreditávamos que suas armas eram mais fortes que as nossas, talvez nos poderiam mostrar hologramas de outros grupos errantes que tinham sido aniquilados por violar a lei. Acrescentaram que suas armas não somente destruíam civilizações mas sim, eram tão fortes que podiam vaporizar as almas dos habitantes. Eles podiam nos retornar à mente do Primeiro Criador para não existir mais, não nos dariam a possibilidade de encarnar em nenhuma forma! Senti um calafrio na espinha.

O Conselho continuou dizendo que mais tarde em nosso desenvolvimento seria óbvio para nós que tínhamos estado na fase adolescente. Desavenças como as de Enki e Enlil passariam com o tempo e teriam servido para um fim. Enquanto isso não nos permitiria destruir planetas ou fraturar o tempo com estas explosões. Recordem. Eles concluíram com a palavra RECORDEM!!!

Anu estava visivelmente aturdido; eu nunca o tinha visto assim. Eu tratei de lhe falar mas ele nem sequer me notou. Anu retornou a Nibiru, Enki e Enlil voaram à estação orbital. Os três ficaram em comunicação permanente.

Em meio de todas as discussões e reparos, onde cada filho culpava ao outro, apareceu em nossas telas de comunicação uma mensagem urgente: Marduk tinha sitiado todo o sistema solar pleyadense. Durante muitos anos em segredo tinha fabricado exércitos de clones e os tinha treinado em um planeta abandonado. 

O temor que tinha aprendido a tirar da raça humana lhe servia agora como alimento e energia para apoiar este projeto impressionante. Com um ataque supressivo entrou nas Pleyades e destruiu a monarquia governante. Agora tinha tudo sob seu tirânico controle e ordenou a Anu que se rendesse ou do contrário destruiria Nibiru. Anu escapou com Antu a um sistema vizinho.

Todos estávamos sobressaltados. Enki e eu voamos com Matali ao centro da Terra para nos escondemos no profundo mundo subterrâneo do Reino da Serpente, onde estaríamos a salvo dos restos da radiação do Gandiva. Enlil saiu para unir-se a seu pai Anu. Os dois estavam decididos a desenvolver um plano para recuperar Nibiru e liberar as Pleyades.

A salvo, e além das freqüências de tempo do planeta desolado, nossa família observava com horror como Marduk começava a apoderar-se do que estava na Terra e seus habitantes. Com o tempo se apoderou de seu planeta. Não utilizou exércitos para conquistar a Terra, usou a propaganda.

Os sacerdotes de Marduk acusaram Enlil de desatar o terrível Gandiva contra os indefesos humanos. Era, depois de tudo, a verdade e por isso Marduk fez que os habitantes da Terra se voltassem contra Anu e Enlil.

Marduk fez todo o possível por me difamar. Dizia que eu era uma bruxa malvada que devorava aos homens e convertia mulheres inocentes em prostitutas. Como cobiçava meus templos e as terras que possuíam minhas sacerdotisas, iniciou uma campanha de difamação para destruir a estas mulheres. Minhas sacerdotisas, que estavam muito bem treinadas em negócios e nas artes, foram acusadas de magia negra, de lançar conjuros por toda a Terra. Sempre que algo saía mau, uma tormenta ou um problema nas colheitas, jogavam a culpa nas minhas mulheres. E Marduk se encarregou de que muitas coisas saíssem mau. Minhas belas sacerdotisas foram encarceradas, golpeadas, torturadas, violadas e queimadas vivas. confiscaram-se todas as suas propriedades. Marduk estava se vingando de mim, a que ordenou que o enterrassem vivo.

No Reino da Serpente, eu jazia em uma pequena cama em um quarto cômodo mas não me dava conta do que havia a meu redor. No olho de minha mente vi como os homens de Marduk desfiguravam e mutilavam meus templos. Todas as imagens das deusas foram substituídas pela sua própria. Esculpiu seu nome em pedra por cima do meu e reescreveu a história, convertendo-se a si mesmo no herói de cada conto e lenda. Em meio de uma agonia impotente vi como minhas sacerdotisas sofriam todo tipo de humilhações. Há tantos contos de fadas sobre virgens, às que se levam aos dragões e as presas em cavernas escuras. Estas histórias estão apoiadas na verdade, mas não havia nenhum cavalheiro em armadura que devesse resgatar a minhas belas sacerdotisas.

Marduk não se deteve com minhas mulheres; não estaria satisfeito até que esmagasse a todas as mulheres. Para obter isto, usou os homens. Disse aos humanos varões que eles eram superiores, que a mulher tinha sido criada da costela de um homem para que lhe servisse. Mentiras, mentiras saíam da boca dos sacerdotes de Marduk.

À medida que as mulheres perdiam sua posição de respeito, os homens por sua vez perdiam parte de si mesmos. As coisas não voltaram a ser iguais. Inclusive fazer amor se converteu em uma guerra. Como Marduk queria mais súditos para controlar e mais energia do temor que se gerava, fomentou a procriação de seus súditos. Na lua da Terra colocou um aparelho eletromagnético que conectava a ovulação feminina com seus ciclos. Nem sequer os animais da Terra se podiam fecundar com tanta freqüência como suas mulheres. Marduk queria produzir o temor como uma mercadoria, assim que ordenou aos Lulus que se multiplicassem. Isto lhe daria mais súditos para tiranizar e assim poderia gerar mais energia a partir de seu temor.

O temor se converteu na mercadoria mais valiosa para Marduk. O temor imperava: temor à morte, temor ao castigo, temor ao conhecimento. Com uma fonte tão ilimitada, Marduk podia alimentar a suas legiões de clones e a Terra se converteu em uma central elétrica para Marduk e seus tiranos.

E tiranos eram; dos governantes dos países até os administradores de companhias, a tirania era a lei. Impor a vontade de um sobre outro era a expressão mais altamente valorizada da vida humana. Com a tirania chegou sua amiga, a avareza. E como ninguém pode estar perto daqueles que controla as coisas, os troféus da conquista e o controle substituíram ao amor. O prazer se definia em términos de posse e os objetos substituíram à intimidade. Do Reino da Serpente, eu vi o futuro deste mundo projetar-se ante meus olhos. Vi como Marduk se voltava mais e mais ardiloso em suas técnicas de controle e de gerar temor sobre os Lulus. Sacerdotes e políticos desfilavam diante de mim; os estilos trocavam, mas a tirania fundamental permanecia intacta. Uma garra invisível se pulverizou pelas mentes e almas dos habitantes da Terra. A Inquisição, o sistema feudal, centenas de "ismos" que prometiam esperança vinham e se foram. A industrialização trouxe consigo o trabalho vazio, aumentou o materialismo e poluiu as águas, a terra e os mantimentos.


Marduk aperfeiçoou a manipulação com a chegada dos meios de comunicação: televisão e jornalismo. Repetidamente os humanos eram treinados para adorar algo fora de si mesmos; não lhes animava a olhar para dentro. Sempre havia alguém lá para adorar, alguém que era melhor e mais elevado. Duvidando de si mesmos, os Lulus escutavam sem cessar aos "peritos", quem por sua vez se contradiziam entre si aumentando deste modo a confusão.

Os humanos que conseguiam pensar por si mesmos eram excluídos como desadaptados, eram castigados ou no melhor dos casos os faziam se sentir culpados. Se a gente obtinha algo, os outros se sentiam inferiores e se fomentou o sentimento de culpa. A psicologia se fez popular e os humanos lhes davam o dinheiro àqueles que escutavam seus sentimentos de culpa e temor durante horas, dias, anos. Para Marduk a culpa era tão nutritiva como o temor.

Se havia uma escassez de temor Marduk ocasionava uma fome, um terremoto ou um furacão. Isto podia ser real como sucesso real na natureza, ou podia simplesmente ser um holograma ou um programa de televisão.

Da minha pequena cama, o futuro da Terra se via desalentador.

À medida que viajava pelo tempo, de repente comecei a compreender como um raio que golpeava meu cérebro cansado, que Marduk somos nós. Ele era o inconsciente coletivo da família de Anu projetado sobre a Terra. Tínhamo-lo criado do mesmo modo como tínhamos criado tudo de nossas vidas. Cada um de nós tinha dado a luz ao Marduk nesta dimensão. Obviamente, se o tínhamos criado, também podíamos nos desfazer dele. Mas como?

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